Naquele Fevereiro de 1939 um frémito de emoção perpassava as páginas do jornal católico Notícias da Covilhã, bem evidente nos seus títulos de caixa alta:
“Faleceu o papa Pio XI.”.
Compreende-se. Já podia deixar algo confusos, alguns leitores sem capacidade para lerem o sentido figurado das afirmações, outras peças jornalísticas que vieram a ser escritas sobre assunto do momento na comunidade católica. Uma delas, publicada na edição seguinte do semanário, era encimada por um título onde se lia “Pio XI Pontífice Imortal”. Entende-se a intenção subjacente à afirmação, mas – o português é muito ingrato como diria o humorista Herman décadas depois – é suposto que se alguém é verdadeiramente imortal, não morre. Mas vamos adiante.
Mário Quintela, um homem notável que, não sendo natural da Covilhã, aqui viveu uma grande parte da sua vida, deixando o nome ligado a várias realizações na cidade – poucas, e disso ele queixava-se –, era o que hoje se poderia chamar um “opinion maker” local. Escrevia regularmente no Notícias da Covilhã, de que chegou a ser Director. Numa das suas crónicas da época, entendeu detalhar a origem de uma lenda que corria, na cidade: Haveria – diziam os mais velhos - enterrada algures na Praça do Pelourinho, a caveira de um burro que possuía o maléfico poder de impedir todo o progresso na Covilhã.
A lenda, segundo Mário Quintela, viria do tempo das Invasões francesas. Num certo dia, um coronel do exército de Junot entrara na Covilhã com o seu destacamento militar. Vinham cansados, estropiados e o coronel ao passar pelo vila do Paul, teria ali “requisitado” à força um burro – já não em muito bom estado de saúde – para o conduzir até à Covilhã. Ao transpor o arco do Pelourinho à frente das suas tropas, o burro foi-se a baixo, pregando com os costados do coronel na calçada, causando-lhe vários ferimentos e até a fractura de uma perna. O coronel ficou tão furioso com a humilhação, que evocou os seus deuses para que amaldiçoassem para sempre a terra que fizera a sua desgraça, enquanto permanecesse nela a caveira do burro que, logo ali deu ordens para que fosse sepultado em local secreto.
A caveira nunca foi encontrada e o progresso da Covilhã, foi algum certamente, mas talvez não tenha sido o que podia ser, porque, algures, a caveira do burro, está a cumprir a maldição …
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